ESMOLA NÃO DÁ FUTURO

Djalma Carvalho

Está em curso e já alcança absoluto sucesso em Uberlância, Minas Gerais, a campanha contra a mendicância nas ruas, intitulada “Quem dá esmola não dá futuro”, lançada pelo Ministério Público e que conta com o integral apoio da sociedade organizada daquela próspera cidade.
O Jornal Nacional da TV Globo, de 27/08/2007, dedicou amplo e significativo espaço à notícia da meritória, oportuna e aplaudida campanha de cunho eminentemente social.
Retirados das ruas, praças e semáforos, os pedintes estão sendo cadastrados para a devida reinclusão social. Assim estabelece a campanha: “Quem prova que não tem para onde ir é levado para abrigo público, onde fica até conseguir emprego, ou volta para a cidade de origem.” Os mendigos profissionais, por seu turno, estão sendo levados para a delegacia de polícia especializada e viram alvo de processo judicial.
Lembro-me, agora, dos circos que visitavam Santana do Ipanema, cujos espetáculos levavam alegria, música, cultura e divertimento à população da cidade, especialmente à indócil meninada de minha época. Na primeira parte, dava-se a atividade circense propriamente dita; na segunda, o teatro, quase sempre produzido com todas as dificuldades de uma modesta companhia mambembe, não obstante o talento e a versatilidade de seus atores.
Lamenta-se, hoje, que tudo isso tenha sido substituído pelo milagre da televisão.
Para criticar, em estilo irônico e mordaz, os costumes e a sociedade de sua época, o genial teatrólogo Joracy Camargo escreveu, em 1932, Deus lhe Pague, peça que alcançou grande sucesso no Brasil e no exterior e que consagrou o ator Procópio Ferreira. Iniciava-se o teatro social no Brasil. No interior afora, a partir daí e por onde passou, o circo levou em seu repertório, obrigatoriamente, Deus lhe Pague, então sucesso de bilheteria.
À porta de uma igreja, dois mendigos, enquanto pediam, filosofavam: “Não há generosidade na esmola: há interesse. Os pecadores dão esmola para aliviar seus pecados; os sofredores, para merecer as graças de Deus.” O mendigo rico afirmava a Barata, o mendigo pobre, que a expressão “uma esmola pelo amor de Deus” era passadismo. E, incisivo, arrematava: “Fale de fome. Fome é mais impressionante.”
Há uns dez anos, um garoto, já com aproximadamente essa idade, começou a pedir moedas a todos que paravam no primeiro semáforo da esquina de minha rua. Pedia, batendo a palma da mão no próprio estômago, quase chorando: “Estou com muita fome, moço!”
Hoje, já adulto, usa ele o mesmo método de antes nos sinais de trânsito de Maceió. E continua a benzer-se a cada moeda recebida do piedoso e compadecido motorista. Viciado na arte de mendigar, tornou-se pedinte profissional.
Alguém lhe teria passado a infalível orientação do mendigo-filósofo? Claro que não. Na verdade, tinha razão o falecido Luís Gonzaga, que cantava ao som de sua sanfona: “Uma esmola ao homem que é são, ou o mata de vergonha ou vicia o cidadão.”
Belo exemplo dá ao Brasil a sociedade de Uberlândia, no próspero e politizado Triângulo Mineiro. Afinal, Alagoas até poderia imitar o exemplo de Minas Gerais.

Maceió, setembro de 2007.

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