DIVERTIDOS TROTES

Djalma Carvalho

Existia, no âmbito das agências do Banco do Brasil, sobretudo no interior afora, a prática do divertido trote aplicado no recém-empossado funcionário. Brincadeiras sadias, engraçadas, cujas publicações, compiladas ao longo de quase dois séculos, se confundem com a própria história do Banco. A instituição do trote fazia parte da cultura interna da empresa, naturalmente à revelia dos principais gestores das agências.
Aprovado em concurso público, nomeado e considerado apto nos exames médicos obrigatórios, chegava à agência o novo bancário, ingênuo e inocente, a pisar em ovos ante as primeiras instruções sobre rotinas de trabalho. Tudo lhe parecia estranho ali, inteiramente diferente do que aprendera como candidato em apostilas, cursinhos e em consulta a livros especializados em concursos.
Afinal, novo mundo, nova vida, bom salário, estabilidade de emprego e futuro garantido para si e para sua família. O Banco do Brasil oferecia, então, um dos melhores empregos a gerações e gerações de jovens brasileiros, hoje orgulhosos de um passado de glória, de trabalho honrado e de intensa luta em defesa do nome dessa respeitável e vitoriosa instituição nacional.
Não obstante seu lado cômico, às vezes intrigante, o trote servia, no mínimo, para despertar no novo funcionário o cuidado com as artimanhas do mundo real, acautelando-o quanto aos sobressaltos da vida de bancário. Ingenuamente, o novato era levado, por exemplo, a assinar papel em branco, a jurar solenemente respeitar os códigos de trabalho do Banco e a desembolsar quantia destinada à “aquisição” de arma para sua defesa pessoal, valor que depois se transformaria em bebida em animadas farras. Com o papel assinado em branco, os organizadores do trote criavam, posteriormente, as mais embaraçosas situações para o novo servidor. Igualmente, não passava impune a bazófia daqueles que, detentores de curso superior, se diziam também poliglotas.
Lendo, agora, o livro Pelos Meus Olhos – uma visão da vida, do tempo, dos fatos vividos, ouvidos, narrados –, autobiografia de José Severino do Carmo, nele encontrei inusitado trote de que fora vítima o autor, que é aposetando do Banco do Brasil.
Chegado, à noite, à cidade de São Bento do Una, agreste pernambucano, para posse no dia seguinte, José Severino foi levado, em clima de hospitalidade, para a república de futuros colegas, onde o colocaram numa cama, cujo proprietário estaria a serviço do Banco fora da cidade. Tarde da noite, porém, o novo hóspede acordou, assombrado, com uma arma de cano longo apontada para seu rosto, e o mal-encarado sujeito a perguntar, aborrecido, aos nervosos circunstantes: “Quem é esse filho da puta que ocupa minha cama!?”
Acostumara-me a ouvir histórias de trotes aplicados em bancários que acabavam de tomar posse na agência de Santana do Ipanema, minha cidade natal. Por isso, deles me livrei em minha posse no BB. Mas, tempos depois, quando nascia minha primeira filha, vi, surpreso, minha casa invadida por colegas, que foram tomar o tradicional cachimbo, após encerrado o expediente de uma sexta-feira de verão do ano de 1963. Para o auspicioso evento, fizeram circular na agência, mesa por mesa, especial convite com minha assinatura nele aposta, caprichosamente imitada.

Maceió, setembro de 2007.

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