Bordadeiras dos povoados Ilha do Ferro e Entremontes começam os trabalhos do projeto Tecendo a Manhã

Cultura

por Jorge Barboza

Tecendo a Manhã e a Tarde na Boca do Vento

Elas estão animadas com as oficinas levadas às duas comunidades sertanejas pelo Barco Museu no Balanço das Águas

O projeto ?Tecendo a Manhã?, que o Museu no Balanço das Águas realiza no sertão alagoano, vai de vento em popa. A coordenadora da ação de arte-educativa patrocinada pela Caixa Econômica Federal, Maria Amélia Vieira, reuniu-se na semana passada com bordadeiras dos povoados Ilha do Ferro, no município de Pão de Açúcar (distante 250 km de Maceió), e Entremontes, em Piranhas (a 290 km da capital), para prestar consultoria às artesãs das duas comunidades que ficam às margens do rio São Francisco.

Maria amélia com bordadeiras de entremontes


?O projeto ?Tecendo a Manhã? vai gerar ações no campo do artesanato, com base no entrecruzamento de experiências de mulheres bordadeiras das cooperativas de artesanato da Ilha do Ferro e de Entremontes, e com intervenções feitas pela nossa consultoria. O resultado desse trabalho será visualizado pela população das duas comunidades e também pelo público de Maceió, onde faremos exposição, ampliando assim as possibilidades artísticas e comerciais dessas notáveis artesãs?, explica Maria Amélia Vieira.

A coordenadora ? que é artista visual e vem realizando esse trabalho de inserção cultural e social em comunidades do baixo São Francisco desde 2008 ? reuniu-se com as artesãs da Ilha do Ferro na famosa ?Boca do Vento?, uma área de convivência repleta de esculturas e móveis em madeira feitos pelos maridos das bordadeiras. A movimentada e alegre Boca do Vento fica nos fundos da casa de Rejânia Rodrigues, filha do mestre Fernando Rodrigues (1929-2009) ? pioneiro da arte popular de esculturas e design de móveis em Pão de Açúcar.

Rejânia


Rejânia, 47 anos, diz que o turismo na Ilha do Ferro ?desapareceu?.
?Nunca mais vi turista por aqui. Nem sei dizer o mês que algum visitante esteve na Ilha do Ferro?, afirma a bordadeira, desapontada, contando com as ações do projeto ?Tecendo a Manhã? para melhorar este momento de estagnação. ?Espero que os quadros que estamos bordando com imagens do nosso povoado e do rio chamem a atenção dos turistas. A intervenção de Maria Amélia ajuda a dar mais perfeição ao nosso trabalho ? é novidade para nós.?

A arte do boa-noite
Apesar de conhecerem a técnica do redendê e do ponto-de-cruz feitos em Entremontes, as bordadeiras da Ilha do Ferro se especializaram num bordado especial que é chamado de boa-noite. ?Eu aprendi a fazer olhando minha mãe?, diz Poliana Lima, de 32 anos, que não descuidou de passar a arte para a filha. ?Eu faço esse bordado desde os oito anos. Aprendi com a minha mãe?, conta Rejânia, afirmando que a técnica ?já está no sangue?. ?Se você achar uma mulher aqui na Ilha do Ferro que não sabe fazer o boa-noite é porque ela não é daqui.?

?O segredo é o desfiado ? se não fizer direitinho não fica bonito?, diz Poliana sobre a técnica do boa-noite. ?È importante que seja feito num tecido bom, senão o bordado perde a qualidade. Compramos o tecido em Arapiraca.?

Poliana, bordadeira Ilha do Ferro


De acordo com a bordadeira Iraci Nunes, 46, o boa-noite chegou a Ilha do Ferro pelas mãos da senhora Ernestrina. ?Ela era de Sergipe e veio morar aqui. Isso tem muitos anos, não é do nosso tempo. Fazia ponto-de-cruz, labirinto, rococó, mas o ponto forte sempre foi o boa-noite. Ela vendia para fora.?

O prazer de fazer redendê

No povoado Entremontes, com maior fluxo turístico propiciado pela bela e conservada Piranhas, outro grupo de bordadeiras se encontrou com Maria Amélia, na cooperativa Casa do Bordado de Entremontes. ?Eu bordo desde que me entendo de gente. Aprendi com minha mãe e minha tia. Minha avó já bordava, é uma tradição de família?, conta Verleide Gonçalves, 35, esmiuçando a técnica do redendê. ?É preciso pegar seis fios do tecido panamá e daí fazer um quadrado de sete linhas, desenvolvendo então o bordado. É a partir desse quadradinho miudinho é que se cria o bordado inteiro.?

A talentosa Anália Oliveira, 54, não pestaneja: ?Você pode encontrar o redendê em vários lugares, mas aqui é mais bem feito. É o bordado que me dá mais prazer em fazer?.

O projeto ?Tecendo a Manhã? recebe apoio do Sebrae-AL e da Galeria Karandash. Essa troca de experiências entre as bordadeiras da Ilha do Ferro e de Entremontes segue até agosto, quando será realizada em Maceió uma exposição dos trabalhos realizados nas oficinas.

Dalton, Maria Amélia observam colcha com o bordado boa noite

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