Quero dedicar essa crônica aos amigos Mozart Brandão Barros, exímio cavaleiro e divulgador das grandes cavalgadas pelo Brasil, José Zenilton dos Santos (Zenilton), gerente da Fazenda Barra do Tigre, há 35 anos, cidadão de um conhecimento fantástico, Dr. Roberto Salgueiro Silva, proprietário da fazenda e grande incentivador do relato que vou fazer nas linhas a seguir (cavalgada) e os companheiros de missão Dr. Pedro Salgueiro e Iury Pinto.
Inicialmente, quero dizer que ASA BRANCA não tem nada a ver com a ave que deu origem à música imortalizada pelo grande LUA, Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, mas sim de um grande parceiro numa reportagem no vale do Condomínio Tigre.
No dia 25 de março de 2020, chuvas fortes e cabeças d´água nas imediações da nascente do Riacho Camoxinga fizeram com que esse afluente do Rio Ipanema, no sentido popular, botasse uma cheia, uma das maiores dos últimos setenta anos, ocasionando grandes estragos na zona urbana de Santana do Ipanema.
No dia 27 de março, na companhia do amigo Ernande Rodrigues, fiz um registro de três matérias para o Portal Maltanet, mostrando a situação do riacho pós-enchente desde a barragem do amigo Ernandes, que rumores afirmavam ter estourado e provocado a cheia, o que não aconteceu. Essas matérias foram no sentido Camoxinga dos Teodósios/Santana do Ipanema, inclusive passamos pela foz do Riacho dos Almeidas, principal afluente do Riacho Camoxinga no lado direito.
No dia seguinte, 28 de março, liguei para o amigo Ricardo Salgueiro para saber a situação das estradas no sentido Santana para a Barra do Tigre e a notícia foi que estavam muito estragadas. O Riacho Tigre é o principal afluente do Camoxinga pelo lado esquerdo.
Como sabia que o companheiro Dr. Pedro Salgueiro tem um veículo 4 x 4, visando fazer outra reportagem na margem do Riacho Tigre, arrisquei uma resposta positiva, mas ele informou que, para chegarmos ao Condomínio Tigre, só seria possível a cavalo. Fiquei desolado, pois tive uma experiência não tão agradável na primeira vez que tentei montar. Isso é outra história, quem sabe conto um dia.
Depois, pensando com meus botões, lembrei-me de um ditado popular: “Quem tem medo de expelir matéria fecal… não come” – risos. Liguei novamente para o companheiro e perguntei se haveria condições de realizarmos esse desafio, pelo menos para mim, o que foi de imediato aceito.
Dia 29 de março, saímos de Santana do Ipanema na caminhonete Pajero com destino a Barra do Tigre, onde dava para chegar com o veículo. Naquele lugar estavam nos esperando o competente Zenilton e Rogério com os cavalos: Faísca, Corisco, Trovão, Estrelinha e Bolinha, este último destinado a ser meu companheiro de jornada.
Tivemos a alegria de compartilhar essa jornada com o companheiro Iury Pinto e a caravana partiu com a seguinte distribuição dos animais: Zenilton (Faísca), Iury Pinto (Corisco), Dr. Pedro Salgueiro (Trovão – manga larga), Rogério (Estrelinha) e eu, que sempre fui na reborréia (Bolinha). Deram-me o Bolinha com a recomendação do Dr. Roberto Salgueiro, que disse a mim: “o Bolinha anda com a criançada o tempo todo, será que vai te derrubar, companheiro Malta?”. Daí fiquei feliz, pois sou uma criança crescida.
Pois bem, devidamente acomodados, câmera pronta, seguimos a missão. Dificuldade aqui, dificuldade ali, caminhos difíceis, pontes arrastadas, riacho correndo e tudo perfeito. O Bolinha era espetacular, só tinha um agravante: era tão manso que não tinha pressa para nada. Daí a assertiva de Zenilton ao nos aproximarmos da sede da fazenda. Vamos trocar o cavalo do Malta. - Rogério, prepara o ASA BRANCA. Comecei a me preocupar. Isso não estava no script, mas não dava para voltar atrás. Quem está na dança, tem que dançar.
Asa Branca é um cavalo maior, de uma estrutura mediana, quase branco, tem um tom de cinza claro e bonito, cor do meu agrado, pois faz a mistura do preto e do branco. Subi e o Zenilton, para me encorajar, disse: - Olha, tem jeito de cavaleiro. Mas, na hora de sair, quem disse que o Asa Branca queria? Mais uma vez ouvi a voz do Zenilton: - Coloca uma espora no pé do Malta. Imaginem minha cara!, mas ele continuou: - Se preocupe não, Malta, dê só o toquinho para ele entender. Tudo vai ficar bem. Pois não é que ele tinha razão?
Até aqui eu expliquei todos os detalhes, mas daqui para frente vou deixar a imaginação de vocês falar sobre a minha experiência com o Asa Branca. Ele foi um parceiro fiel, compreensivo até demais. Passamos por córregos, atravessamos parte de uma barragem com a água tocando a barriga do animal, atendeu a todos os meus comandos, sei lá como eu sabia daquilo.
Fico até arrepiado em relatar isso, pois quando há integração entre o homem e o animal, parece que ele compreende tudo. Como estava com a câmera, e a minha bota não era adequada para sair com facilidade do estribo, optei por fotografar na sela, o que me fez aprender a direcionar o Asa Branca. E ele, após alguns desses momentos, aprendeu de tal forma que percebeu que eu tirava a mão dos arreios para fotografar e a façanha maior é que também entendeu os cliques da câmera, pois ao terminar a foto e baixar a mão, o companheiro já seguia a viagem, sem a necessidade da espora.
Chegou o momento mais tenso. Subir uma serra que era de tamanho considerável, mas o Asa Branca mostrou sua destreza e conhecimento. Por passar por aqueles caminhos constantemente, pois nascera e crescera ali, não teve dificuldade alguma. Deixei-o seguir por onde ele sabia e chegamos ao topo da serra, sem nenhuma dificuldade. Sentimos um certo cansaço, mas de forma comum.
O mesmo não aconteceu com o Trovão, pois além de estar sem uma das ferraduras, uma pedra pequena entrou no casco e maltratou um pouco, obrigando o companheiro Dr. Pedro e o Trovão a esperarem um pouco enquanto fomos ao local muito belo de onde pudemos fotografar todo o vale do Condomínio Tigre e quase toda a extensão do Riacho Tigre, inclusive as três barragens da propriedade: Bebedouro, Viúva e Joel.
A missão estava quase cumprida. Agora retornar. Quando nos preparávamos para a descida, Corisco inventa de não querer mais seguir com o companheiro Iury Pinto, obrigando a troca de animais. Rogério cedeu Estrelinha.
Mais na frente, a pedido do Zenilton, que percebeu o Trovão mancando e como o trajeto seria grande, pois optamos por descer a serra, com acesso à estrada da Camoxinga dos Teodósios, para passarmos na barragem do Governo, como é conhecida, ou parte dela, pois está praticamente destruída, mais uma troca de cavalos foi feita. E dessa vez foi o Trovão que foi com o Rogério por um caminho mais suave e o Dr. Pedro Salgueiro ficou com o Corisco.
Cavaleiros prontos, a viagem segue seu rumo normal, até próximo da Barra do Tigre novamente, passamos por boa parte da estrada Camoxinga dos Teodósios/Santana do Ipanema, depois tomamos rumo ao nosso local de retorno. No meio do caminho, uma cena inusitada. Um motorista resolveu atravessar o Riacho Camoxinga com uma Ford Ranger e não deu outra. Seu carro ficou preso nas pedras. Passamos a cavalo, com destino ao ponto de partida, onde estava o veículo que nos trazia de volta a Santana do Ipanema.
Chovia fino e chegamos em paz. Eu estava em êxtase, pois além de cumprir a missão a que me propunha, consegui vencer o medo de cavalgar. Sei que não fui um exímio cavaleiro, mas de uma certeza tenho, o Asa Branca foi um grande companheiro. Talvez até mais sensível do que certos humanos que conheço. A ele, minha gratidão.
Como ninguém é de ferro, no Bar da Quitéria na Barra do Tigre, onde deixamos o veículo, pausa para descanso. Os companheiros Dr. Pedro e Iury pediram uma cerveja gelada, Zenilton pediu uma branquinha e eu apenas tomei dois copos da loirinha, uma vez que não tinha o vinho, minha bebida preferida.
Devidamente acomodados, vi a saída dos animais com o destino ao descanso merecido, após a jornada que durou cerca de cinco horas. Nossa gratidão a todos, em especial ao ASA BRANCA, por ter me aturado no seu lombo, sem reclamar e ainda me compreender.
Já está marcada nova missão e espero contar novamente com a parceria do Asa Branca e da experiência do amigo Zenilton, a que reverencio com gratidão.
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