QUANDO CHEGUEI ELA NÃO ESTAVA MAIS

Luciene Amaral da Silva

Era domingo, dia 08 de março, sabia que precisava ir vê-la como faço todos os meses, deveria ter sido com mais frequência, mas diversos fatores impediam e o maior deles era a vontade.

Mesmo assim, nesse domingo "tinha" que ir vê-la. Não deveria ser uma obrigação para deixar a consciência limpa, deveria ser um desejo, deveria ser prazeroso ir. No entanto, grande parte das vezes, onde o domingo é o único dia de colocar a vida de casa em dia, ver os pais, ficar com os filhos, frequentar a religião e ter que vê-la, não fazia daquele momento algo agradável.

Mas, era só sair de casa. Confesso que o lugar não era agradável de se estar porque ele exigia, ou melhor, sugava de mim todo tempo de reflexão. Lá eu pensava na vida, ou melhor em como concluir minha vida na terra. Esse lugar "puxava minhas orelhas" mostrando como devia levar minha vida atual para que ao envelhecer não sentisse arrependimento de não ter vivido o que de fato eu considero essencial. Visto que, o conceito de essencial é subjetivo, pois o que pode ser essencial para mim, necessariamente não será para o outro.

Quando chegava no portão a primeira pessoa que avistava era ela, de fato, aquele lugar não era para ela. Ela era extraordinariamente viva, independente dos seus 90 anos de idade completados. Revelou que fazia palavra cruzadas desde os 17 anos e seu riquíssimo vocabulário demonstrava sua habilidade com as palavras.

Seus cabelos bem penteados e com algum acessório, juntamente com seu terninho, entregavam uma vida de requintes e sofisticação, sua visão de mundo mostrava como as viagens lhe trouxeram grande contribuição. E todo dia sempre me recebia dizendo, "aqui não é lugar para mim". De fato, aquele lugar não tinha nada com ela, mas ela estava lá.

Quando eu perguntava quer saber o que está acontecendo no mundo lá fora? ela prontamente respondia, "não, porque isso não me acrescenta em nada". Quando perguntava sobre sua família, de novo respondia "não gosto que fale sobre minha família, não quero saber", e assim passava muitos dias.

Mas, neste domingo, dia 08 de março, comprei uma rosa, um presente e com muito sacrifício fui visitar. Quando cheguei, me assustei porque o quarto dela ficava defronte a porta principal e lá estava outra senhora. Pensei em várias possibilidades: mudou de quarto, faleceu, mas não esperava dizerem que tinha ido embora para outro lugar. De fato, nunca mais a verei. Ela não voltará mais e assim encerramos nossa amizade, nossa história. Muito aprendi. Ela passou na minha vida e deixou grande experiência.

Tentei aprender como viver bem uma vida inteira. Não dá para esperar que um dia sejamos felizes. A felicidade tem que ser todo dia, porque também, o conceito de felicidade é subjetivo, o que é felicidade para um, ´pode não ser felicidade para o outro.

E assim, mais uma experiência, uma história de vida, que muita gente tem o privilegio de viver/aprender sem precisar sofrer. Cada dia é um dia e todo dia é dia de ser feliz.

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