Queria fazer uma cronica relatando a vida de Marinalva Rodrigues Santos, mas o momento não me permite e encontrei já pronto um texto de autoria do confrade Romildo Pacífico dos Santos, que com a permissão do autor, será meu mensageiro nesta ocasião e nossa homenagem a essa matriarca vitoriosa.
Dona Navinha
Por Romildo Pacífico dos Santos“Dona Navinha, ou Navinha, nada mais é que Marinalva Rodrigues Santos, nascida Rodrigues de Souza, minha mãe.
Nasceu predestinada a assumir posições, a tomar decisões. Logo aos 6 anos de idade, quando morava com os pais, no Sítio Bom Sucesso, em companhia de mais 2 irmãs e 3 irmãos, foi-lhe perguntado se “toparia” ir morara com a tia Júlia, que havia casado havia pouco tempo, com Mizael Vieira Rêgo, na Lagoa do João Gomes. Navinha topou, na hora. A partir dai, nasceram os primos que se tornaram os seus irmãos mais novos: Mirom, Deusdedith, Francisca, Marinosa, Antéia e Maria.
Navinha terminou se casando aos 18 anos, com José Pacífico, meu pai, filho de sua professora Angelina e de Pedro Pacífico, indo morar no Sítio Alto Bonito, mais de uma légua em direção ao Olho d´Água do Amaro.
Até ai tudo transcorria conforme o ritual da época, onde a mulher era a auxiliar do marido e a responsável pela criação da prole, sempre que possível, numerosa. Navinha teve 5 filhos, em 6 anos de casada, tendo um falecido com 6 meses de idade, Denival, coisa até comum, na época, em região onde não se tinha conhecimento da existência de médico e se curava doença com a boa vontade das rezadeiras.
Mas eis que acontece a mais dura prova para Navinha. Seu marido adoeceu, de tuberculose, nos idos de 1943, doença incurável na época. Após tentativas de cura, faleceu em 09/12/1946. Navinha ficou com 4 filhos, o mais velho com 5 anos, que hoje escreve estas linhas, e a mais nova com apenas três meses de idade, Amparo. Com 4 e 3 anos respectivamente, Maria da Luz e Benildo.
Seus sogros a levaram para sua casa, inicialmente para que reformasses a casa do Alto Bonito, pois era perigoso continuar residindo em uma casa onde havia morrido uma pessoa com aquela doença. Mas o objetivo de seus sogros era que Navinha deveria ficar com os 4 filhos morando co m eles, pois diziam que uma mulher jovem, de apenas 25 anos de idade, não tinha condições de assumir uma família, com 4 filhos pequenos, com tão poucos recursos disponíveis. Os recursos eram apenas 100 tarefas de terra, sendo 70 por cento de mata, 2 vacas com bezerros, 2 novilhos, algumas galinhas, algumas ovelhas e só.
Foi ai que Dona Navinha tomou a grande decisão na sua vida. Contrariando o planejamento de seus sogros, de quem gostava muito disse que ia voltar para o Alto Bonito, com os 4 filhos, e iria tocar a roça, no inverno que se aproximava e assim o fez.
Transcorria o mês de fevereiro de 1947.
Como providência inicial, vendeu uma das vacas, para se capitalizar, reabriu a escolinha para ensinar primeiras letras, a filhos dos vizinhos e ativou uma pequena máquina de costura que possuía, anunciando que sabia costurar, principalmente roupas de homens.
E pôs mãos à obra. Deus ajudou, pois, a partir dali, até 1951, todos os anos foram de bom inverno. Tudo o que se plantava, dava. A partir de 1947, portanto, Dona Navinha foi-se revelando uma excelente administradora. E ai, aconteceu o que é óbvio: até os estranhos, quando veem que uma pessoa é trabalhadora, interessada, procuram ajudar. Quando D. Navinha precisava de juntar pessoas, para limpeza de sua lavoura, havia algumas que até deixavam a sua roça esperando e vinham satisfazer o pedido que ela fazia. Enquanto isso, D. Navinha varava noites, madrugada a dentro, fazendo calça, camisa e até paletó, para esses mesmos trabalhadores. E Dona Navinha caprichava. Um paletó feito por ela era negociado entre eles por valores acima da média normal.
Dona Navinha obedecia a vários princípios que a fizeram prosperar, a ponto de ficar reconhecida como uma pessoa das mais prósperas da região. Meu tio Pepê, irmão de meu pai, em comentário comigo, sobre a fase da mamãe, no Alto Bonito, certa vez disse que os seus cunhados se prontificaram a ajudá-la, quando ela ficou viúva, mas que o seu trabalho foi coroado de êxito, que se equiparou com as sobras na administração dos filhos, proporcionando meio de vida compatível com os dos fazendeiros da época. Entre os princípios que Dona Navinha cultivava estavam os de economia, onde ela dizia que “a economia começa por um fósforo”. Como a cultura escolar da época era muito escassa, gostava de enfatizar princípios que constavam da antiga “carta do ABC”, em sua última página, que dizia, entre outras coisas:
– a preguiça é a chave da pobreza
– mais vale adormecer sem ceia, que acordar com dívidas;
– quem não ouve conselhos, raras vezes acerta.
Em outras palavras, Dona Navinha também obedecia aos seguintes princípios árabes: nunca diga tudo o que sabe, nunca faça tudo o que pode, nunca dê tudo o que tem.
Outro toque administrativo de Dona Navinha se revelou ao não por obstáculos quando seus filhos se determinaram a estudas. Muito pelo contrário. Sempre os colocou na escola, despertando neles o interesse pelos estudos, a despeito de algumas pessoas influentes dizerem, com frequência, que os filhos quando vão crescendo é para se destinaram ajudar os pais, que naquela época queria dizer “se dedicar aos trabalhos do campo”.
A visão de Dona Navinha estava correta, pois os seus filhos terminaram progredindo nos estudos, alcançando a finalidade visada por ela.
Antonio Rodrigues Damasceno, conhecido como Totonho de França, líder político e empresário destacado de Olho d´Água do Amaro, pessoa conhecedora das famílias de toda a região rural de Santana do Ipanema, sempre diz quem naquelas época, 3 viúvas se destacaram na criação dos filhos, encaminhando-os da melhor forma possível, estando entre elas, Dona Navinha e Dona Sebastiana Damasceno, mãe de Cloves Damasceno, de Olho d´ Água das Flores, que depois foi meu colega de Banco do Brasil e da Faculdade de Direito, na UFAL.
Dona Navinha, depois de ver os filhos bem encaminhados, na cidade, com seu objetivo alcançado, adquiriu uma casa na Rua Delmiro Gouveia, em Santana do Ipanema, onde vive até hoje, administrando sua vida de maneira independente, aceitando apenas orientações dos filhos, que a visitam sempre que possível.
Texto extraído do livro Do Alto Bonito, 2ª Edição Imprensa Oficial Graciliano Ramos – 2011”
Dona Navinha não foi conhecida do grande público santanense, mas foi respeitada no seio familiar como uma matriarca vencedora. Morou de forma simples na Rua Delmiro Gouveia, jamais perdeu o encanto pela vida e pela família, sendo sempre visitada por seus filhos, principalmente por Maria do Amparo, a mais próxima dela.
No último domingo, 18 de março de 2018, às 7 horas recebo uma mensagem da Doutora Andréa Pacífico, neta de Dona Navinha, que reside em João Pessoa na Paraíba, avisando-me que a sua avó foi para o Pai Celestial. Morreu para esta vida, deixou o seu legado.
Romildo Pacífico, seu filho mais velho e líder da prole, optou por um velório simples, como foi sua mãe, e um sepultamento da mesma forma: Uma encomendação do corpo no Memorial OSACRE de foi conduzido em cortejo puramente familiar até o Cemitério Santa Sofia.
Eu, como associado efetivo da Academia Santanense de Letras, Ciências e Artes, cumpri o meu dever de confrade do escritor Romildo Pacífico e fiquei honrado em poder participar, junto com os familiares do último adeus a Dona Navinha.
Que o nosso bondoso Deus conceda-lhe um lugar de Paz e que seu exemplo possa ser seguido por nós outros que por aqui ficamos um tempo a mais.
Santana do Ipanema – AL, 19 de março de 2018
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