SÓ VAI ACOCHANDO TUDO

Clerisvaldo B. Chagas

SÓ VAI ACOCHANDO TUDO
Clerisvaldo B. Chagas, 10 de junho 2011

Todas as grandes obras do Sertão deram trabalho. Trabalho de dezenas e dezenas de anos de reivindicações, lutas, protestos, zoadas. Hospitais, rodagens, asfaltos, pontes, delegacias, terminais rodoviários, escolas, repartições públicas, cursos superiores, açudes e tantas outras coisas fizeram o sertanejo perder o sono e afiar a goela. Na minha existência ainda não vi governo bonzinho para o Sertão. Tudo é como foi dito acima, inclusive água e luz.
Quem já teve oportunidade de viajar pela BR-316, de Palmeira dos Índios em direção a Inajá, em Pernambuco, fica encantado com o chamado retão que corta o peneplano sertanejo. É quando o motorista diz que de Palmeira dos índios a Inajá você roda sem mudar a marcha. Quando as estradas de barro eram bem conservadas, tive oportunidade de fazer essa viagem de Santana do Ipanema a Inajá numa carreira só como se fala por aqui. Estradona larga, bem conservada que ─ usando outra expressão popular ─ parecia um prato. Na época, o verdume da caatinga e o cheiro inebriante do mato, deixavam no viajante uma sensação enorme de bem-estar. Ao longe, o morro do Carié, em forma de lagarta, destacava-se no raso de caatinga servindo de importantíssimo ponto de referência. É o entroncamento mais importante do Nordeste, diziam. Dali pode ser usada a rosa dos ventos para Maceió, Paulo Afonso, Garanhuns e suas respectivas capitais. Continuando a reta a partir do Carié, íamos passar dentro de Canapi e depois no acesso a Mata Grande até chegar ao estado de Pernambuco. O resultado é que o asfalto rodeou o Carié, (na época com apenas um casa e um hotel) distrito agora que congrega centenas de moradores, mas a parte oeste continua no barro. A estrada foi sendo desprezada e atualmente o trecho Carié fronteira com Pernambuco é um tormento físico e paraíso de assaltantes.
Esse protesto no entroncamento causou um imenso transtorno. Mas quem luta há quase cinquenta anos pelo asfalto, sabe que se não fizer assim, não sai nunca. É incalculável o prejuízo daquela região pela falta de benefícios nas cidades e no campo, durante essas cinco décadas. Parabéns pela coragem nas batalhas duras que enfrentam, cidades de Canapi, Inhapi, Mata Grande, Água Branca e o distrito Carié, juntamente com outros municípios pernambucanos na ponta da linha. Se ainda fosse vivo talvez assim cantasse, o saudoso repentista santanense, Zezinho da Divisão, com seu mote preferido:

Se você quer ser ouvido
Grite que só condenado
Por que um grito bem dado
Dói nas oiças do bandido
Se você for atrevido
Passe por cima de tudo
Pois só assim o buchudo
De longe lhe compreende
Gritando ao corno ele atende
SÓ VAI ACOCHANDO TUDO



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