Antonio Machado
A falta de autoridade no Nordeste aliada à carência de uma política desenvolvimentista, numa terra seca e hostil, talvez sejam fatores que levaram os sertanejos a fazerem justiça com suas próprias mãos, constituindo-se com isto o êmulo do cangaço que pontificou no Nordeste notadamente de 1.920 a 1.940. Nesse período o cangaço, nasceu, floresceu e.deu seus frutos ácidos. Com a morte de Lampião no dia 28 de julho de 1938, e a morte de Cristino Gomes da Silva Cleto, Curisco, em 25 de maio de 1940, fechou-se o ciclo do cangaço no Nordeste. Este assunto tem servido de tema para muitos escritores, pesquisadores e estudiosos, muitos livros teem sido escritos, teses defendidas nas universidades e prato cheio para a literatura de Cordel, que ainda hoje permeiam as feiras sertanejas do Nordeste afora.
Um dos mais alentados pesquisadores do cangaço, foi o Pe. Frederico Bezerra Maciel, que palmilhou os rastros dos cangaceiros e escreveu substanciosa obra nesse campo, cita o ilustre pesquisador que, cerca de trinta e nove mulheres compunham o cangaço nordestino, porém a mais famosa delas foi sem dúvida, Maria Lina, ou Maria Déia, e posteriormente Maria Bonita, nascida aos 8 de março de 1911, sendo filho do casal Filomena Déia e José Gomes de Oliveira, mas conhecido por Zé Felipe, ambos residentes em Malhada do Caiçara pertencente a Jeremoabo, estado da Bahia e morreu no dia 28 de julho de 1.938 ao lado de Lampião quando do massacre de Angico. Os pais de Maria Bonita viviam da agricultura, cultivando uma lavoura de subsistência, eram pais de outros filhos, Maria Bonita criou-se na vida campesina, no labório de casa e no traquejo dos animais, mormente o criatório de cabras, face a boa aceitação de adaptação desse animal na região. Estava moça feita, brejeira bonita, corpo bem feito, cintura de pilão, cabelo comprido aberto ao meio e lábios sensuais, era uma morena provocativa, diziam até que era namoradeira, porém a escassez de rapazes na época era grande, o que levou seu pai a tomar a decisão de arrumar um bom partido (casamento) para sua filha. Zé Felipe conhecia o sapateiro José Miguel da Silva, mais conhecido por Zé Neném que trabalhava naquela região prestando serviços naqueles arrabaldes, como também concertava e fazia trabalho para Lampião e seu bando. Era um solteirão, já com mais de 40 km rodados na estrada da vida, sem muita tendência para o sexo oposto, vivendo na sua tenda chocando os ovos, quase sem acordar a chocadeira, era meio amorfo. Maria Bonita ao tomar conhecimento de que seu pai engendrava seu casamento com Zé Neném, que ela sequer conhecia , ficou desgostosa, porém não houve jeito, o casamento foi celebrado no religioso, e Maria Bonita passou a ser a esposa do sapateiro Zé Neném, que quase seis meses depois ainda não a tinha desvirginado, continuava intacta com o mesmo selo da fábrica, deixando-a amargurada. E certo dia Maria Bonita contou sua desdita a sua mãe, e esta por sua vez a seu marido que tentou persuadir Zé Neném de consumar o matrimônio, mas Zé Neném, cioso e com poucos instrumentos e menos aptidão para empreitada, andou fuçando por aqueles terrenos baldios, quase nada fazendo, deixando sua linda pequena igual à casa de Abrantes, igual como d’antes, com polinevrite.
Maria Bonita ouvia em casa os cabras de Lampião contar suas proezas e valentias, e certo dia disse a Luiz Pedro, cangaceiro do famigerado bandoleiro que se Lampião quisesse ela iria embora com ele e realmente foi, deixando Zé Neném para nunca mais, que de tão triste e com o diploma de “corno” debaixo do braço, foi embora para o Mato Grosso, e pode até ter cantado: “meu casamento acabou-se, vou embora para o Mato Grosso, não quero mais saber dela...”. Com a ida de Maria Bonita, morar com Lampião, abriu-se o ciclo da mulher do cangaço nordestino, que foi por um período pequeno, apenas uma década, aproximadamente. Maria Bonita era mulher de gênio forte péssimo, e encontrou em seu amásio Lampião, sua outra metade, pois ambos se completavam também na perversidade, um segurava para o outro matar sem dó nem piedade, e assim enxovalharam o Nordeste espalhando medo e a morte entre as pobres famílias sertanejas indefesas, e hoje quando se comemora o centenário de nascimento de Maria Bonita (1.911 – 2.011), muitos escritores insinuam em pintar um quadro do cangaço, 73 anos depois de sua morte, com tintas coloridas, amparando-se na Sociologia, respaldada nos direitos humanos. Quanta ironia! A verdade não pode ser escondida, porque a palavra é para se dizer como citava o imortal Graciliano Ramos. E concluo meu artigo com o que disse o capitão José Bezerra: “a verdade eleva o nível moral do homem, a coragem o conduz a vitória e a justiça garante-lhe a paz”.
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