"Fanatismo"

FANATISMO

Um bom momento para perceber, detectar e analisar fanáticos políticos são justamente em épocas de crises graves
✅ Adriano Nunes

O fanatismo voltou à moda. Ou melhor, pôs o bloco da seita pop nas ruas e nas avenidas das redes sociais e dos aplicativos de mensagens. Homem-bomba agora parece ser coisa de um passado distante, para quem quer ser um fanático top de linha de verdade. O fanatismo prêt-à-porter é a velha nova ideologia da modernidade cujo nome de fantasia é religião política. Nada de explosões! Apenas bombardeios de falsas informações, pela manhã, à noite, à tarde.

Há algumas características essenciais que podem ajudar a identificar pessoas pertencentes ao séquito do negacionismo e do obscurantismo, os fiéis a um líder populista autocrata, aquela ubíqua autoridade, os seguidores alienados e imbecilizados amalgamados à certa crença em algum líder-pastor, diversas vezes, quase um fascinazi. As ovelhas fanáticas operam como robôs. O gado segue cego ao matadouro.

Pois bem: a primeira e mais importante característica é a negação da realidade, uma abominação total e, às vezes, até violenta, das factuais verdades. Não adianta provar que 2 mais 2 são 4. Não adianta provar que a Terra não é plana. Dizer que o nazismo era de extrema-direita, que o NSDAP era de extrema-direita, nada adianta. Não adianta dizer que vermífugos e antiparasitários nunca tiveram eficácia comprovada contra vírus (ainda que possam ser testados para ver se funcionam de fato). Não adianta dizer que a Terra gira em redor do Sol. Para o fanático político, a realidade existente é aquela em que acredita desde quando os olhos ele abre, aquela em que ele e os membros da seita política sentem-se confortavelmente bem e sem serem ameaçados ou feridos, por pensarem que as suas crenças não podem ser desmascaradas, expostas ao ridículo.

O fanático é incapaz de refletir sobre as suas próprias posições e sobre as ideias que lhe chegam via além ou via Whatsapp. Incapaz de reflexões reflexivas, de contestar aquilo a que tanto se apega à vera, o fanático precisa encontrar sempre uma ilusão (tomada sempre como verdade, uma verdade de pedra!) para estar bem consigo ou para transformar ou agregar tal ilusão à realidade que engendra na alma e na carne.

Para o fanático, os outros estão sempre errados (principalmente se identificados como adversários), sempre são os inimigos a ser convencidos ou combatidos. A crítica incomoda o fanatismo. O fanático sempre procura achar uma desculpa ou uma justificativa para não reconhecer que o objeto de sua crença política pode estar equivocado, errado, pode ser corrupto, ser um farsante ou falso profeta, um tirano.

O fanático político acredita que o seu político de estimação foi um enviado pela divindade, que será a salvação da pátria, do povo, do mundo, na hora H, no dia D. Quando nada dá certo, logo lança o argumento da perseguição ou do impedimento: nunca o líder da seita é visto como incapaz ou incompetente, como gente que erra ou mente. Sempre há um estorvo, um empecilho, um obstáculo, uma praga.

O fanatismo não é uma canalhice tática. A busca por um norte desesperado, por um destino messiânico, faz com que o fanático abrace a sua crença como se estivesse abraçando a vida em si. O fanático educado continua sendo educado até que o fanatismo diga alto "pare!". Há fanáticos à esquerda, à direita, ao centro. Mas são mais frequentes aos extremos.

Fanatismo político não deve ser confundido com loucura. Os loucos não tentam convencer ninguém fervorosamente de que possuem uma verdade salvadora, uma moral transcendente, uma realidade perfeita. Os fanáticos são moralizadores par excellence. O moralizador é aquela pessoa que quer impor às outras uma moral moralizadora, a que ela mesma não exerce.

Um bom momento para perceber, detectar e analisar fanáticos políticos são justamente em épocas de crises graves. Eles estão por aí. Têm diversos apelidos, codinomes, etc. Só mais um importante detalhe: dos altamente cultos, com PhD e títulos vários, aos leigos sem crédito para enviar fake news pelo zap, os fanáticos estão em toda parte.

Adriano Nunes