Ensaio XIV - De Grenoble a Paris via TGV
Em fim, nos despedimos de Grenoble, não por acaso, curtindo já muitas saudades.
Numa manhã alegre, tomamos o TGV com destino a Paris, eu e a minha mala, com alça, mas, “uma mala”, com seus quase 50 kilos de bagagem. A Rosa Cecília concluía o seu mestrado e coube a mim transportar a sua biblioteca (livros publicações e trabalhos escolares) e parte da sua mudança. Antes do embarque, quebra-se um dos rodízios da mala, pensei e agora como vai ser em Paris, uma vez que a “Gare de Lyon”, estação central, fica distante e terei que trafegar por longos corredores e escadarias e mudar duas vezes de metrô até chegar a Montparnasse, onde residem o meu irmão Hélio, consultor de economia, e sua esposa Marília, membro da representação diplomática brasileira.
Procurei não sofrer antes da hora, o meu objetivo naquele momento era curtir a viagem no trem de grande velocidade, TGV, tão discutido e desejado aqui nos trópicos, para ligar nossas principais megalópoles. A linha do TGV Paris – Lyon, de aproximadamente 460 km foi inaugurada em 1981, a primeira implantada na França, logo depois, chegaria a Grenoble, local de nossa partida. A viagem de Grenoble a Paris é feita em pouco mais de 3 horas, devido as paradas em Lyon e outras estações. O TGV interliga mais de 200 cidades na Europa, sendo que a maioria na própria França, a uma velocidade cruzeiro variável, entre 250 e 300 km/h. Em 2007, no percurso Paris – Estrasburgo o TGV bateu seu próprio recorde de velocidade, atingindo a marca de 574,8 km/h.
Magnífica viagem, num abrir de olhos para contemplar as inúmeras vilas - “antigos condados medievais” e a paisagem rural de variadas tonalidades, do verde bandeira ao amarelo ouro – nos fazendo lembrar da imensidão verde dos nossos canaviais, dos cafezais mineiros, dos arrozais maranhenses ou dos laranjais paulistas, eis que é anunciada a nossa chegada a Paris. A essa altura da viagem, passados quase 30 dias, as emoções se misturavam. Ora de saudade das paisagens alpinas com seus picos ainda um pouco nevados e seu verde retumbante cordilheira abaixo premiando o vale do rio Isére, saudade da fina cozinha francesa do aconchegante bairro de Notre Dame, ora de vontade de retornar aos sertões das Alagoas.
A viagem de TGV, embora curta, nos permitiu fazer uma reflexão sobre os nossos transportes terrestres comparativamente aos da Europa. Enquanto no Brasil as políticas públicas estão atreladas aos interesses corporativos, na Europa essas mesmas políticas via de regra contemplam os interesses nacionais.
A implantação da indústria automobilística no Brasil sem dúvida abriu novas perspectivas econômicas, criou empregos e de maneira extremamente multiplicadora ajudou o Brasil a ingressar no clube das dez maiores economias do planeta.
Entretanto, esse crescimento vem acontecendo desordenadamente sem garantia de sustentabilidade, provocando congestionamento e saturação dos serviços públicos essenciais – abastecimento de água, sistemas de esgoto e tratamento de resíduos sólidos, geração de energia e infra-estrutura de transportes em geral, repercutindo diretamente na qualidade de vida, principalmente nos grandes centros urbanos.
Hoje, em pleno século XXI, ainda se discute no Brasil a implantação da primeira linha férrea de alta velocidade - LAV, para funcionar até junho de 2.014, ligando São Paulo ao Rio de Janeiro, como um dos compromissos assumidos em função da realização da copa do mundo de futebol no Brasil.
Mas, como era de se esperar, aflora o “complexo de vira lata” se contrapondo a esse projeto com os argumentos de que devemos primeiro combater as filas nos hospitais para então nos preocuparmos com as filas nos chekins das companhias aéreas, entendendo que, com o TAV ligando os dois maiores centros urbanos do País, as Companhias aéreas perderão espaços para os trens. Na verdade, essa é uma grande polêmica que envolve muitos bilhões de dólares e sobretudo vontade e determinação política.
Pausa na minha reflexão, chegamos a Gare de Lyon em Paris, eu com a minha mala, diante de um burburinho de trens e pessoas aos milhares, uns chegando outros partindo, procurava nas plataformas se alguém conhecido teria vindo me receber.
Afinal no Brasil aonde chego encontro sempre algum amigo ou uma cara conhecida que me dá boas vindas, será que em Paris é diferente? Foi aí que me lembrei da estória de um conterrâneo de Atalaia, que perdido nos corredores do Congresso Nacional em Brasília dirigia-se atabalhoadamente aos deputados e senadores perguntando se não tinham visto o coronel Zeca Lopes, prefeito daquele município, mediante a negativa ele então exclamou: “Cuma não conhece Zeca Lopes?! O home é mais conhecido do que fôia”!
Foi aí que meu irmão apareceu e podemos seguir para sua casa curtindo a chegada de mais um caipira a Paris!
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O TGV na estação de Montparnasse, em Paris
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