VISITANDO O “CAMPO SANTO” SANTA SOFIA

Pe. José Neto de França

No dia 01 de novembro de 2021, dia de Todos os Santos, sabedor de que não teria tempo no dia seguinte, Dia de Finados, resolvi visitar o Cemitério Santo Sofia em Santana do Ipanema onde estão sepultados os restos mortais de meu pai, vários outros familiares, além de numerosos amigos próximos ou distantes que passaram pela minha vida ao longo dos meus 63 anos.

“Passeando” entre túmulos e/ou sepulturas simples, não centrei meu pensar na suntuosidade ou não do local onde jazia o que sobrou na temporalidade das “vestes da alma” de cada conhecido ou desconhecido. Porém, diante de alguns, detive-me por instantes, e vasculhando o arquivo de minha memória lembrei-me de algum ou alguns fatos do passado próximo ou distante em relação a mim e os “privilegiados”.

Meu pai: Alonso Rodrigues França e minha irmã Terezinha França Farias.

Meu confidente e amigo. Dois acontecimentos veio-me a memória: o primeiro quando, aos 16 anos, tornei-me independente e fui residir em São Paulo. Quando estava de saída ele me entregou duas pequenas orações, orientando-me a rezá-las diariamente para que nada de mal acontecesse comigo. Assim o fiz e nos doze anos que morei na capital paulista, jamais tive problemas insolúveis. O segundo, um pouco mais de dois meses da morte dele, quando, em viagem a Roma, Itália, tive uma experiência paranormal onde o vi e, em uma conversa longa com “ele”, ficou na memória apenas uma pergunta que lhe fiz (Papai, o senhor por aqui?) e a sua resposta (Onde estou não existe problema de tempo e de espaço). Senti uma imensa saudade!!!

Quanto a minha irmã Terezinha, uma pessoa especial, lembrei da maior alegria que lhe proporcionei, quando numa visita a Santana do Ipanema, quando ainda residia em São Paulo, numa viagem de férias, lhe presenteei uma boneca (a última que lhe dei).

Minha avó materna, Maria Umbelina Vilar, meu tio Espedito Fidelis de Farias e seu filho (meu primo), Ivanildo Vilar de Farias...

Gostava de visitar vovó tanto no Sítio Junco, como também enquanto ela residiu em Carneiros e em Santana do Ipanema. As “estórias de trancoso” (fictícias) que ela contava eram bem interessantes. De tio Espedito e de Ivanildo meu contato com eles foram poucos. Era mais ligado, enquanto criança e adolescente, com tia Maria, esposa de tio Espedito... Depois, praticamente perdi a proximidade...

Meu tio Cícero França Vilar e minha tia Antônia França Vilar

Não pude deixar de recordar as visitas que eles faziam aos meus pais quando eu ainda era criança e residia numa casa que foi de meu avô paterno (que nem existe mais) no bairro da Floresta em Santana do Ipanema. Sentia-me muito bem com essas visitas...

Rodolfo Soares Araújo

Ainda parente de sangue, tanto por parte de pai, como também por parte de mãe. Um dos meus melhores amigos da atualidade. Prematuramente foi chamado ao coração de Deus, na iminência de se graduar em Medicina. Recordei-me das longas conversas que tínhamos através do Instagram. Foi merecedor de um livro, “Uma amizade que se prolonga para a eternidade”, minha sétima obra onde narrei nossa amizade e nossas conversas tanto no Instagram, quando no Facebook.

José Hélio Vaz da Costa

Um de meus melhores amigos de infância. Recordei das brincadeiras nos quintais de sua casa e da minha e das vezes que ia assistir o seriado, “Jerônimo, o herói do sertão”, na TV de sua residência, em alguns finais de tarde. Vez ou outra brigávamos, mas logo fazíamos as pazes... Coisas de crianças/pré-adolescentes.

Meu sobrinho José Jean de Souza

Cultivávamos uma sólida amizade. Ele tinha um grande respeito por mim e eu por ele. Era um excelente mecânico. Foi ele quem me acompanhou até o Seminário em Maceió, em fevereiro de 1991, depois que sofri um acidente enquanto dirigia uma Combi (Volkswagen). Depois do ocorrido (cai de uma ponte entre a entrada de Poço das Trincheiras e o povoado Alto do Tamanduá, sentido Santana do Ipanema), numa manhã de domingo, um amigo chamado Paraná, resgatou o que sobrou do veículo, deu uma “ajeitada” e, com uma autorização do DNER (hoje DENIT), levei-o de volta ao Seminário. Janinho, como chamava carinhosamente meu sobrinho, foi comigo para qualquer eventualidade. Ele foi assassinado em outubro de 1992.

Narcélio Robson de Melo

Outro amigo de ginásio. Companheiro de resenhas, estudo e trabalho em grupo, brincadeiras... Lembrei-me de uma vez que resolvemos “pegar” goiabas no quintal de uma senhora que morava em uma casa pegada a outra onde ficava o escritório de contabilidade de seu pai. Fizemos isso só para provocá-la (coisas de adolescentes), já que ela tinha um papagaio que denunciava qualquer um que entrasse no quintal: “ladrão”... Achávamos isso divertido.

Pedro Pacífico dos Santos, Angelina Pacífico dos Santos e Antônio Pacífico dos Santos

Pedro e Angelina, pais de Antônio Pacífico, todos católicos praticantes, residiram numa casa à frente da de meus pais, quando eu ainda era pré-adolescente. Eram pessoas muito queridas na cidade. Recordei do dia que seu Pedro faleceu. Quando fui dormir, ouvi o pessoal cantando a “Sentinela”, canto próprio para esses momentos, na cultura da época. No outro dia, após o sepultamento do corpo de seu Pedro, dona Angelina falou para minha mãe que mandasse alguém colher uns legumes (quiabos, maxixe...) que havia no quintal de sua casa. Eu fui o escolhido. Enquanto colhia, comecei a ouvir uma música, tipo clássica... Fiquei a ouví-la durante todo dia. Ao perguntar se alguém ouvia também a resposta era negativa. Parei de ouví-la somente quando adormeci naquela noite. Percebi, então, que se tratava de uma experiência paranormal.

Quanto ao seu Antônio Pacífico, foi quem primeiro me estendeu a mão, dando-me um trabalho quando eu ainda era pré-adolescente. Trabalhei num bar de sua propriedade. Fazia de tudo e me orgulhava de ganhar meu dinheirinho honestamente. Isso não me prejudicou em nada nos meus estudos. Recordei-me das vezes que ia com ele, no final do expediente, para as periferias de Santana rezar o Santo Terço e pregar a Palavra de Deus. Essa prática, posteriormente ajudou muito na minha vocação sacerdotal.

Adeildo Nepomuceno Marques

Meu padrinho de batismo. Grande político de Santana do Ipanema e amiguíssimo de meu pai. Veio-me a memória uma recepção que a população de Santana do Ipanema fez para ele, com Banda Fanfarra e tudo que tinha de direito, quando ele retornou de Maceió, onde esteve preso injustamente devido a intrigas políticas. Tendo provado sua inocência, voltou de cabeça erguida. Eu estive nessa recepção com o meu pai.

José Conrado de Lima

Foi meu professor de história no meu tempo de Ginásio. Residia à frente da segunda casa que meus pais moraram na rua Delmiro Gouveia, em Santana do Ipanema. Foi um grande amigo de meus pais. Não era um professor exigente. Nunca tive problemas com ele em sala de aula.

José Vieira da Silva

Um dos fundadores (leigos) do Movimento Bíblico de Santana do Ipanema e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, também de Santana. Profundo conhecedor da Bíblia Sagrada, esteve presente em minha vida desde quando eu era adolescente e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais funcionava em uma pequena casa ao lado da casa paroquial de São Cristóvão. Acompanhei a construção da nova sede do Sindicato. Viajei muito com ele, enquanto seminarista e enquanto padre para as reuniões, Vias-Sacras e encontros bíblicos. Recordei-me da última Missa que ele cantou com o coral dos bíblicos numa sexta-feira, véspera do “incidente” que o levou ao óbito. Ele cantou com todo o entusiasmo que lhe era característico. Após a missa conversei com ele, mais ou menos uns vinte minutos, à frente da Igreja Matriz de São Cristóvão, sobre as Santas Missões Populares que estávamos para realizar. No dia seguinte, sábado, pela manhã, soube que ele havia dado entrada no hospital local, transferido para Palmeira dos Índios e posteriormente para Arapiraca. Na terça-feira, a pedido de familiares, fui ao hospital daquela cidade ministrar-lhe a Unção dos Enfermos e na quinta, ele veio a óbito. Foi uma lastimável perda.

Maria Moura da Silva (Dona Carminha)

A grande responsável pela entrada das mulheres no Movimento Bíblico de Santana do Ipanema. Apesar do pouco estudo que possuía, tinha uma excelente capacidade para refletir a Palavra de Deus. Era Ministra Extraordinária da Comunhão Eucarística e membro do Apostolado da Oração e da Legião de Maria. Recordo fortemente dela à frente dos Encontros das Mulheres que eram realizados sempre no segundo domingo da quaresma de cada ano, além de sua função de Ministra...

José Francisco Nogueira e Mailde José Nogueira

Casal amigo meu e de minha família. Os conheci desde minha pré-adolescência, mas aproximei-me mais a partir de meu período de vocacionado. Nossa amizade se tornou mais estreita a partir do momento que me tornei pároco da paróquia de São Cristóvão. Zé Nogueira era meu “braço direito”. Tinha “carta branca” para agir em todo território paroquial. Recordo-me das vezes que ele chegava lá em casa com aquele jeito tímido que lhe era característico e falava de algum problema que estava acontecendo com alguma família. Pela confiança que eu tinha nele eu simplesmente dizia: “resolva e traga-me a conta”. E ela resolvia. Quanto a sua esposa, dona Mailde, ela era um pouco mais reservada, mas sempre me acolheu fantasticamente bem em sua residência. Todas as vezes que chegava lá, nunca faltava uma fatia de queijo qualho e aquele café que ela sabia que eu tanto gostava...

Pe. Ronaldo Aloísio da Silva

Grande amigo no sacerdócio. Foi contemporâneo de seminário. A humildade que o caracterizava, desde o tempo que o conheci, ainda vocacionado e depois, no Seminário, não mudou quando se tornou Sacerdote... Ao olhar para a foto que estava sobre seu túmulo, recordei-me de minha última conversa com ele, alguns dias antes de seu óbito. Ao fazer-lhe uma visita, na casa de sua mãe onde estava, ele me falou que as dores estavam mais intensas. Disse-me que em alguns momentos, recolhia-se no seu quarto, fechava a porta, ligava a TV e aumentava o volume para que ao gemer por causa das dores, sua mãe não ouvisse e assim não se preocupasse... Esse era o Pe. Ronaldinho, como carinhosamente o chamávamos. Simples, humilde, humano!!!

Depois da visita ao “Campo Santo” (Cemitério Santa Sofia), retornei à casa de minha mãe, pensando sobre a finitude da vida temporal e a eternidade que se aproxima a revelia de nossa vontade. Não estava triste, apenas saudoso...

À noite, ao retornar a Major Izidoro, aproveitei para rezar a oração do Santo Terço não somente pelas almas daqueles que, à tarde, recordei com mais intensidade, mas por todas as almas...

Descanso eterno dai-lhe Senhor! Que a luz perpétua o ilumine!

[Pe. José Netode França]

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