Vejo, no cenário nacional de hoje, longas filas de gente à porta da Caixa Econômica Federal e de Loterias em busca do chamado Auxílio Emergencial, de R$600,00, valor a ser liberado pelo Governo Federal, por três meses, em virtude da pavorosa pandemia do Coronavírus.
Gente com máscara e gente sem máscara. Para esse pessoal sem máscara não importa se está ou não sujeito à contaminação do vírus devastador da Covid-19. Pura indiferença. O que lhe interessa mesmo é receber a parcela de valor pouquíssimo superior a meio salário mínimo. O desespero está falando mais alto que o perigo de contrair a doença e, daí, fatalmente, o perigo de morte. A fome, no caso, tem valor superior à vida.
O Brasil e o mundo estão em polvorosa com essa pandemia, com esse aterrador vírus que também alcança, impiedosamente, países do primeiro mundo. A sociedade brasileira, particularmente, começa a desestruturar-se, tanto em sua vida social quanto em sua vida econômica.
Inúmeras mortes, muito desespero, muita gente desempregada.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) e os governos estaduais recomendam a quarentena, o isolamento social (“Fique em casa”). Quase tudo neste país está parado, sem funcionar, exceto supermercados, farmácias, hospitais e serviços essenciais. Daí o desespero dos trabalhadores, das empresas, do comércio, do sistema produtivo, das famílias, das pessoas mais humildes, dos “invisíveis” (pessoas sem RG, CPF sem referência, sem emprego).
Disse o sociólogo José Pastore em 11/12/2002, então professor de Economia e Administração da USP, frase singularmente apropriada ao atual momento brasileiro: “São eventos críticos da vida: a falta de trabalho, a perda da saúde, a velhice e a morte.”
Ora, se o salário mínimo em vigor (R$1.045,00) já não permite, de forma regular, a garantia de sobrevivência de uma pessoa, de uma família, avalie a quantia de R$600,00, deferida a título de auxílio emergencial, uma modesta ajuda ao desesperado trabalhador brasileiro, ao desempregado em geral.
Criado por Getúlio Vargas com a Lei nº 185, de janeiro de 1936, e Decreto nº 399, de abril de 1938, o salário mínimo somente entrou em vigor em 1º de maio de 1940. Valia 240 mil Réis. Curiosamente, por essa época existiam no Brasil 14 salários mínimos de valores diferentes. Na capital do país, o salário mínimo correspondia, aproximadamente, a três vezes o do Nordeste. A unificação somente se daria em 1984.
Por falar em salário mínimo, vale lembrar o talentoso e festejado jornalista Sebastião Nery, escritor, folclorista, memorialista, muito conhecido na imprensa nacional. Foi deputado estadual pela Bahia (1962) e deputado federal pelo Rio de Janeiro (1982). Jornalista vibrante e combativo. Como colunista militou nos maiores jornais do Brasil. Autor de vários livros.
Sempre apreciei suas matérias publicadas em rede nacional. Em Maceió, por exemplo, não deixava de ler suas histórias engraçadas, de folclórico político, principalmente, publicadas na Gazeta de Alagoas. Vejamos, então, a historinha intitulada “Neoburrismo”, de 09/5/1996.
Escreveu, então, Sebastião Nery: “Alguém vendo dois homens limpando a praia, com uma carroça puxada a cavalo, pergunta:
¬ – Quanto ganham?
Resposta: Cada um dos três ganha um salário mínimo. Nós dois e o cavalo.
– O salário mínimo dá?
Resposta: Para nós dois, dá. Para o cavalo, não. Ele come ração e ração é cara.”
Observe-se, afinal, que o custo de vida no ano do diálogo (1996) estava em absoluta alta, a julgar pelo custo da ração do cavalo.
Maceió, abril de 2020.
Comentários